Idílio


Estrada Teresópolis - Rio/ Foto: Paulo Francisco




Em minhas searas inventadas
entrego-me em clarões solares
em chuvas estelares
e em banhos lunares

Em minhas searas inventadas
produzo flores campestres
girassóis e trigos
Ceifo em épocas distintas
mortes e vidas

Em minhas searas inventadas
deito-me na rede, e sem sacolejos,
viajo em mundos perfeitos
entre todas as estações.

Segredo


Sobre a pele leve
- pluma
maciez de menina
- candura
Sob a pele leve
- espuma
efervescência de mulher
- loucura
Entre as duas, eu sobejo na lua.

Entrega


Se não há mais fôlego, se não há mais forças, então não corra, renda-se aos meus braços, aos meus abraços e deixe acontecer.
Façamos realidade os nossos sonhos secretos e indiscretos. Respiremos o mesmo ar. Cheguemos de mansinho, façamos um ninho em nossos corações. Vamos ler, na rede da varanda, em braile, as nossas confissões.
Se não há mais concentração, desligue-se então, jogue tudo pro alto, ouçamos as nossas vontades e pensemos depois. Não, não deixe escapar o que temos de mais bonito - este desejo que transcende, que abrasa, derrete os nossos corpos e nos leva para os céus.
Se não há mais o que temer, feche os olhos e deixe o vento trazer-te até mim. Confesse aos pássaros, declare-se a andorinha, desnude-se ao sol, banhe-se para a lua. Pinte as unhas de vermelho, pinte a boca de vermelho, saia do chão e venha através das nuvens, venha acompanhada de querubins. Cante-me uma canção apaixonada, diga-me palavras de amor.
 Consagre a nossa união. Deixe a noite clarear os nossos destinos.
Aqui tem montanhas, estrelas rendeiras e a lua da cor do coração. Tomemos na mesma taça o tinto da paixão. 
Se não há duvidas, se não há mentiras, então venha, venha para os meus braços, receba meus abraços, troquemos afagos – sem recatos - tudo isto será muito bom.
Mesmo que seja vertiginoso todo esse querer, transformemo-los no bem, transformemo-los em flor, transformemo-los em cores. Façamos versos, façamos canções. Cantemos pra lua, pro céu, pras estrelas.  Transformemo-los em realidade.
Desarme-se e venha, meu amor.
Venha para os meus braços, para os meus abraços, quero te fazer feliz.
Ah, se esse amor represado rompesse, e invadisse os nossos quereres, nos encharcando de ardor.
Ah, meu amor, como eu quero fazer-te minha, como eu quero alojar-te em meu coração.
Ah, como quero fenecer em teus braços depois de uma noite de amor.

Entre mar e céu




Na ausência da existência deste teu céu azul, furto-me do ar que respiro. Sufoco-me de seu nome até não mais aguentar. Quero ir para as margens do rio de teu coração.
Na insistência de não querer este meu mar de cores, recorro ao cruzeiro do sul. Quem sabe assim você me segue neste destino do amor.
Não tenha medo, venha, venha sem pudor, venha na clareza do poeta. Venha na calada da madrugada, venha no entardecer, não importa, mas venha amanhecer o meu amor.
Estou à espera de você aqui, nesta varanda de flores, nesta rede de sonhos, neste ninho de cores, nesta certeza de amar.
Deixe a incerteza de lado, basta de tessitura, sobrepujemos os pudores e bendigamos os nossos sentimentos.
Traga somente a semente do amor – amanhamos nossos corpos à lua cheia. Deixemos reflorescer o que já fora, um dia, mortificado.
E enquanto você não vem, meu amor, fico aqui nesta ilha da saudade, neste atol da vontade, olhando o meu céu de todas as cores, na esperança que surja nas montanhas, você.




Distância


Longe assim, fico ateu
perco meu chão
Longe de ti, fico assim
menos eu
pura ilusão
Longe de mim, não há mar
não há céu
não há...
Longe assim, não há sorte
não há norte
perdição
Longe assim, há engulho sem mar
Longe assim, há soterramento sem morte
há sofrimento - zurzido coração.

Despedida





Ele não vai embora, permanece e chora, parece que gosta de me fazer sofrer. Xô! Que eu não te quero mais, já chorei o suficiente para encher um oceano; eu já não o quero mais. Não te amo.


Já o mandei embora, mas é tão contumaz, que já nem sei mais o que fazer. Xô! Que eu não te quero mais, já o desalojei por tantas vezes que já não sei mais o que fazer.


Vá embora, não permaneça aqui, não me ilude em quimeras, nem tudo é maravilha, como parece ser. Xô! Que eu não te quero mais, já o desobstruí de meu caminho, já não sou mais um menino que não saiba o seu querer.


Vá embora, chega de matulagem, não quero mais essa condição de ser apenas mais um em sua coleção. Xô! Amor ingrato, sem recato, que só me faz sofrer.


Xô! Eu não o quero mais em meu coração.

Suplica




Venha! Faça-me ternura, traga-me o aroma da flor.
Vista-se em sorrisos, deixe  o pecado pra depois -  expurgue-se de tal sentimento - cubra-se de pólen e venha.
Venha com o vento. Venha a contento.
Façamos estrelas em teto de madeira. Cavalguemos em campos de linho numa tarde leitosa transformada em banho de espuma e as nossas epidermes, em cobertores aquecidos.
Venha... venha sem culpa, sem atino, simplesmente venha,deixe o recato lá fora, desnude-se em atos, traga somente, por ora, vontades a serem cumpridas.
Venha  carregada por libélulas carregadas pelo ar.
Venha coberta de insensatez, mostre-me sua nudez. Venha, simplesmente venha, e juntinhos ouviremos o vento lá fora,a proclamar ao mundo, a nossa paz. Não quero menos que isto.
Não quero menos que lua e estrelas no nosso céu marinho.
Não quero menos que as brumas envolvendo os nossos corpos e lavando as nossas almas.
Não me importa se fado ou tango; se Mozart ou Ravel; se branco ou preto; se Florbela ou Cecília; se Drummond ou Vinicius. Quero em quereres mais que Caetano quis.
Venha, meu amor! Faça-me seu. Assopre o braseiro da existência em mim. Transforme-me em ex-suicida.
Faça-me chorar e rir de amor. Olhe em meus olhos e veja minha alma. 
Cubra-me de lírios brancos.
Conservemos as margaridas no jardim.
Façamos juras de amor.
Venha, meu amor! Não deixes de vir.
Faça deste amor que é só meu, um amor de nós dois.




Da varanda da minha casa




Da varanda da minha casa, vejo o céu em movimento, montanhas em verde pleno, barulhinho de passarinhos, vento em redemoinho e a criançada a brincar

Da varanda da minha casa, recebo o sol matutino, a brisa com carinho e a lua a me vigiar

Da varanda da minha casa, ouço canções de amor, leio os meus autores preferidos, tomo uma taça de vinho, sorvo os meus delírios e vivo as quatro estações

Da varanda da minha casa, despeço-me do verão e recebo de braços abertos a minha estação outonal.

Da varanda da minha casa, recarrego a minha alma e aqueço o meu corpo com os sóis invernais.

Da varanda da minha casa, vejo tudo florescer, são flores primaveris que aromatizam os meus sonhos, colorem minha vida  a cada amanhecer.

Da varanda da minha casa, escrevo os meus poemas, resolvo os meus dilemas, vivo prazeres e alguns desprazeres.

Da varanda da minha casa, intrujo as indiretas, perpassam os fantasmas, rouquejo pequenos versos guardados no coração.

Da varanda da minha casa, vejo o belo, vejo o tosco, imponentes concretos, armaduras de ferro, singelas choupanas e seus jardins eternos.

Da varanda da minha casa, vejo tua varanda, vejo-te debelando o inimigo com sorrisos e gritos

Da varanda da minha casa, desenxovalho, desfibro o anoitecer.

Da varanda da minha casa, clareio meus caminhos, espalho sorrisos e espanejo a solidão.

Da varanda da minha casa, versejo ao tempo, versejo ao infinito, sulco em neblinas pálidas e livro-me do obscurantismo.

Da varanda da minha casa, observo os coleópteros pesados e desengonçados virados ao chão, observo os  lepidópteros diurnos e noturnos  bailarem em coreografias ensaiadas, enquanto embalo-me à rede.

Da varanda de minha casa, vigio, de minha rede, os guabirus e suas intenções inglórias.

Da varanda da minha casa, varo a vastidão.

Quando tudo - que se espera - está no céu...




Quando tudo terminou, o céu se apagou e os seus olhos que sorriam se fecharam, pra nunca mais.


Quando tudo terminou, o mar desapareceu de mim e os seus braços, que se estendiam em paz, cruzaram-se pra nunca mais.


Quando nem mesmo ouvimos o som do adeus; quando meu coração, que sempre batera em festa, parou, esperando ouvi-la por mais uma vez.


Quando tudo se desfez em areia; quando não mais se ouvia a canção, tornei-me fantasma, a vagar pela escuridão, à procura do que perdi.


Ah, como olhei para o céu, à procura de uma nuvem, que pudesse ser o nosso ninho; Como olhei pra o mar e pensei em navegá-lo, junto a ti.


Oh meu Deus, como imaginei que tudo poderia ser diferente.


Como me doei em versos e prosas e nesta cilada do amor restou-me a dor. Dor doída de matar, dor sem fim.


Como desejei acordar e descobrir que não era real tamanho sofrer, mas eram, eram verdadeiramente reais os hematomas da dor.


Irreais, somente, o meu acreditar, o meu sonhar e o meu querer.


Ah, como o meu coração tão perdido; tão imperfeito; tão abandonado, vagou em escuridões da insistência em querer saber: - Por quê?


E depois de tantas incertezas, olhei para o céu, e lá estava ele, em brancas nuvens.  Sofrer, nunca mais.


E quando tudo terminou, o céu se apagou e a lua surgiu pra mim.


E quando tudo terminou, o céu se apagou e as estrelas cobriram-me em cores.


Ah! Deus existe.


Obrigado! Tu foste minha bailarina, minha menina, minha atriz.


Por acaso te encontrei e, neste acaso, me espalhei em seu universo.


Viajei em sonhos e canções.


Perdi o rumo, fui tolo, talvez um esquisitão.


Celebrei o mês de agosto, sofri mês sim e o outro não.


Escrevi prosas e poemas.


Desenhei seu rosto em areias praianas.


Delirei em searas inventadas;


Subi em montanhas, só para gritar teu nome.


Ainda a tenho no céu de minha boca;


Ainda a tenho perto de mim;


Ainda a tenho como a primeira vez que te encontrei naquela estação.


Obrigado, minha menina, obrigado minha pequena de tantos versos e prosas.


Obrigado pelo silêncio e de se permitir por tanto tempo ficar na sombra de meus poemas.


Obrigado por entender meu querer provocado, minha dor inexistente, meu sofrer apaixonado.


Obrigado por compreender os meus textos na primeira pessoa, por permitir viagens tolas e provar-me o quanto eu estava enganado.


Hoje, viro a página. Faço outro caminho. Sigo outro destino.


Adeus, minha menina, minha pequena, minha atriz.


Que, por muitos outros nomes, foi trocada neste meu reino encantado.


Adeus minha cúmplice de todas as horas, adeus.


Adeus meu céu de todas as cores.


Adeus minha estrela do norte, adeus...


Adeus minha pequena Ana, minha Ana Beatriz, que um dia foi Maria só pra deixar-me feliz.


Adeus...Adeus...Adeus.

Paulo Francisco













.

CAOS

















Está tudo torto/solto/roto
e eu corro desesperado de medo
Está tudo podre/fétido/infecto
e eu tonto de medo
Está tudo acabado/irascível/vencido
e eu fixo/parado/paralisado
pregado de medo
Está tudo errado/incerto/arriscado
e eu cego de medo
Está tudo esquisito/perdido/indeciso
e eu trêmulo de medo
Está tudo por um triz
e sou eu quem diz:
Perigo na esquina
a zona é na calçada
e como prevenção
vacinam-se as meninas
e as mesmas morrem
de fome/de frio
pelas mãos de marginais
Meninos seduzidos por uma batina
Menino amarrado por quem o gerou
[uma forma
          de salvá-lo
                 de todo mal]
Moço espancado
cuspido por outros moços
por ser simplesmente
diferente de outros moços
Velho abandonado
na rua
na praça
em casa pelos seus
Menina estuprada
calada
horrorizada pelo seu genitor
Moça esfaqueada
silenciada pelo seu amor
Mulher queimada
apagada pelo nome da paixão
Está tudo tão errado
que eu morro de medo
Corpo na mala
bebê no lixo
bebê no lago
bebê na grama
arrastado por um carro
voando pela janela
Mulher afogada
Moça desaparecida
Quanto custa viver sem culpa?
Quanto custa viver sem fome?
Quanto custa viver sem medo?
Quanto custa viver em PAZ?!


Paulo Francisco

Constatação

Ainda sobre a Pinto de Azevedo. 
Quando descobri, com treze anos - por acaso - que já tinha conhecido a zona; Entristeci-me e pensei: "bem que eu poderia ter cortado caminho de verdade". Agora é tarde. Não vale mais como surpresa.

CONFORMIDADE



O banzo chega de uma saudade querida
Amor guardado, amor abandonado
Amor perdido (...) fragmentado
O tédio chega de uma saudade sofrida

O desejo parte em forma de brisa
Desejo desfeito, desejo perdido
Desejo guardado, desejo esquecido
Fora para sempre o amor. Quem diria!

Já não sofro, nem de noite nem de dia
Sonho agora, com um novo querer
Que virá (eu sei) em forma de vulcão

Deixarei entrar sem nada perguntar
No coração se instalará
E da mesma forma irá embora
Será sempre assim...
Eu sei!

DESEJO
















Quero ter o medo sucumbido pela voz forte de quem me afaga
O saber da experiência vivida de um amor que não maltrata
Quero as lembranças dos verdes anos mesmo que não sejam boas
Para perceber que valeu a pena chegar até aqui.
Para descobrir a importância das águas, de um novo florescer.
Quero o choro curado pela mão calejada acariciando-me a nuca.
O beijo na testa de lábios ressecados pela longa história vivida.
Quero de novo crescer.

ESCURO





















Escuridão total.
Passos cegos - mente aflita
[Estou só]
Fada minha... Me guie
na imensa historia de minha vida
sofrida/partida/querida.

Paulo Francisco

FIXAÇÃO I
























Passei a noite inteirinha
pensando em você
não dormi...
fiquei na cama sorrindo
pensando... pensando...em você
e quando pensei em dormir
o sol já estava batendo na minha janela
nem liguei
virei pro lado... fechei os olhos
e aí... Ah! Sonhei com você
quem diria que um dia
eu sonharia assim...
com você
quem diria!
foi tão bom estar com você...

FIXAÇÃO II
















Estávamos lá sentados na pedra
olhando o horizonte
brincando de imaginar
Lá estávamos nós num barco pequeno
em águas serenas a namorar
Nós estávamos tão quietos
feitos uma pedra a nos olhar
Não me mexia - estava parado
paralisado, quietinho... pra não despertar.


Paulo Francisco

ASSIM





Hoje eu acordei com vontade de chorar
Não sei por que o coração estava apertado
Eu não estava em mim
Não tinha fome
Não tinha vontade de sorrir
Hoje eu acordei assim
Um tanto tango
Um tanto bolero
Sentia uma vontade imensa de chorar
Não sei por que não reagia
O peito doía
Não queria pensar
Hoje acordei assim
Um pouco prosa
Um pouco poesia
Não tinha vontade de nada
Queria chorar
Doía o peito
Doía a alma
Não era um bom dia
Não sei por que a acordei assim
Hoje eu acordei com vontade de chorar
E chorei.
Tudo bem!
Amanhã será um outro dia.
Quem sabe um tango ou um bolero
Um poema numa prosa
E eu acorde com uma vontade imensa de sorrir
Um tanto rock
Um tanto samba.
Quem sabe?

VELHO



















Sentiu uma vontade louca de sair correndo
mas não pôde - Estava preso!
Preso a cordas invisíveis!
amarras com nós fortes – antigos.
Sentiu uma vontade enorme de gritar
mas não pôde – estava amordaçado!
mordaças aderentes – antigas.
Sentiu uma vontade enorme de não mais existir
mas não pôde – estava preso a um passado,
preso por laços afetivos – antigos.
Então, renunciou a si mesmo
e agora não sente vontade de nada
é pedra esculpida pelo vento
sentado numa cadeira na varanda
ele vê o tempo...
o tempo...
o tempo...
passando...
passando..
passando.

MARÉ


















Estou com uma saudade
tão grande de ver o mar
areia fininha
branquinha
água azulzinha
cristalina
estou com uma saudade
tão grande de ver as ondas
marinhas...
espuma branquinha...
irritadinha
querendo me carregar
pra junto das garças
estou com uma saudade
imensa de ter o mar
só pra mim...
só pra mim...

DENGO

















Hoje eu estou melancólico
um tanto triste
não quero ver ninguém
nem a mulher amada
hoje eu estou saudoso
um tanto tonto
não quero sair daqui
nem pra beber água
hoje eu estou choroso
um tanto preguiçoso
não quero ver o sol
quero ficar aqui
escondido
fingindo um resfriado
uma dor qualquer
porque sei
que tudo passa...
e amanha serei feliz
é minha sina...
pois é...

É PESSOAL

Quem dera não fosse
Estaria no camarote da vida
Observando...
Ousaria até um palpite
Acredite!
Seria tão mais fácil
Rápido de solucionar
Estaria na janela do mundo
Observando
Sua dor
Quem dera não fosse
Estaria fora do palco
Atento
Observando
Lamento...
É pessoal.



NA SALA - UMA CANÇÃO

















Na sala uma musica bonita

falava de estrela, falava de mim, falava de ti

era tão bela a melodia que quase chorei ali

na sala escutava a verdade de uma relação

eu aqui, no quarto vazio lembro da canção

corpo curvado, olhos embaçados

[sei que não é o fim

amanhã estarei melhor]

na sala volto a escutar a canção

que não é mais para ti

(é para mim)