Luzes

Peregrinos de um caminho a ser conquistado
Argonautas de suores e lágrimas
 - argos em busca do amor dourado
Cosmonautas de sonhos e delírios
 - viajantes em cosmonaves invisíveis
 a procura da estrela perdida.
[E os nossos caminhos foram interrompidos

por uma luz divina.]


Paulo Francisco

Vai e Vêm



Morro a cada partida sua
Não é uma morte instantânea
fulminante
É um morrer vagaroso
definhado
corrosivo
que queima a derme d´alma
que desfibrila a carne exposta

Morro
morro a cada ausência sua
e renasço
sempre renasço com o seu retorno tímido
renasço com o coração acelerado
com um sorriso largo
com os braços abertos e as pernas trêmulas

Ah, eu renasço, renasço sim,
renasço com a mesma intensidade
do dia em que lhe vi pela primeira vez
e gritei um grito parido - infinito
como se você estivesse saindo de minhas entranhas
e explodido em múltiplas emoções:
temor e ternura
certezas e dúvidas
brisa e tufão
céu e chão

Mesmo com a pele mais áspera
com as mãos mais trêmulas
e o corpo mais cansado
tornei-me indestrutível nessas idas e vindas
Porque simplesmente sei que não há despedidas
entre nós - meu filho.

Paulo Francisco


Ventando

Ele espalha o que antes era inteiro
fragmenta
mistura
varre
suja
Espanta e assusta
Ele junta o que antes era pó
modela
esculpe
transforma o que não era nada em tudo.


Paulo Francisco

Veloz


O vento corre
navega longe
segue livre
corre
navega
Segue sem destino certo
incorreto, ele corre
corre
corre
mexendo em tudo
até o fim do mundo.


Paulo Francisco


Quase tudo

Restou-me a voz
Restaram-me também os olhos
o som
a cor
Restou-me praticamente tudo
Praticamente tudo...mas não tudo
Há cicatrizes na pele da alma
Marcas profundas tatuadas
nas minhas retinas difusas.
Repito:
Restou-me praticamente tudo
Mas não tudo
Falta o que me foi tirado
e que jamais será recuperado.


Paulo Francisco


De mim




O que escorrem de mim
em minha face
não são lágrimas doídas
não são lágrimas saudosas
São  águas perfumadas
perfume d´alma
alfazema-lembrança
escorrida de dentro de meu ser
para lembrar-me de corpo lavado
que por fora só é textura
camada grossa
bruta
túnica escura
inventada pra proteger-me.
O que escorrem de mim
 são gotas orvalhadas
que aos poucos formam trilhas
trilhas d´água perfumada
com cheiro de alma
alma e jasmim.




Paulo Francisco

Neblina

As montanhas estão vestidas de cinza.
Escorrem do céu, densas capas prateadas
cobrindo as copas de suas árvores.
cobrem , também, a minha pele pálida,
cegam os meus olhos castanhos,
e me impedem de prosseguir em arco-íris.
As montanhas continuam chorosas
rogando pelo sol
desejando o azul celeste
implorando  por outras cores
que não sejam os tons cinzentos existentes,
As montanhas continuam firmes
colossais
magnânimas
apontadas para o céu.
Elas continuam esplendorosas
- eu sei –

mesmo escondidas de mim.



Paulo Francisco

Volátil






Tudo era mágico
belo
perfeito
feito à mão
As nuvens pariam sonhos
todos flutuavam
flores
gente
bichos
e até o chão.
Era tudo tão colorido
lacrimoso
perfumado
inesgotável como a ilusão.
Nem quente, nem frio
nem claro, nem escuro
Estava tudo tão centrado
tão alcançável
tão silencioso
tão perto de Deus
que só poderia ser um sonho
uma viagem interplanetária
intergaláctica
incensaria
que certamente eu voltaria
a qualquer momento
menos insano
mais concreto
ao mundo dos ateus.


Paulo Francisco

Literal




Não há arrependimento
tristeza
nem solidão.
São só raios
chuvas
ventos
trovões
Ventanias na imensidão.
Há palavras
frases em poesias
sentimentos metaforizados
recados empalhados
declarações ritmadas
às vezes pobremente rimadas
outras vezes não.

Mas se há tristeza, arrependimento e ou solidão
declaro-me abertamente pedindo-lhe perdão.


Paulo Francisco




Verde

Tudo claro – amarelo e azul
A brisa acariciou as cortinas
refrescou o cômodo
limpou o chão
Os raios chegaram mansos
dourando a pele
clareando as retinas
brilhando o mundo
tingindo tudo
E os pensamentos antes opacos
surgiam plenos
calmos
divinos
como as cores de um jardim.
Hoje, tudo claro – amarelo com azul.

Paulo Francisco

Desolante



O tempo continua denso
há, no céu, nuvens pesadas
impedindo o brilho do sol
São nuvens carregadas
que trazem lembranças
que trazem medos
que trazem lágrimas
cinzas
negras
de um instante de pavor.
O tempo continua tenso
lá fora
 e
aqui dentro
Amor.

Paulo Francisco